A FUNDAÇÃO DE BUENOS AIRES

Extraído da leitura do livro "Porque as nações fracassam"

Em 3 de fevereiro de 1536 o espanhol PEDRO DE MENDOZA funda Buenos Aires, batizada de Nuestra Señora del Buen Ayre. Expulsos por índios, os espanhóis voltariam em 1580 para nova fundação.


No começo de 1516, o navegador espanhol Juan Díaz de Solís deparou-se com um largo estuário no litoral leste da América do Sul. Desembarcando, Solís reclamou a terra para a Espanha, batizando o rio de Río de la Plata, já que os habitantes locais possuíam prata. Os indígenas dos dois lados do estuário – os charruas, no atual Uruguai, e os querandís, nas planícies que ficariam conhecidas como pampas da moderna Argentina – viram os recém-chegados com hostilidade. Esses povos locais eram caçadores-coletores que viviam em grupos pequenos, sem fortes autoridades políticas centralizadas. Com efeito, foi um bando desses charruas que matou Solís a bordunadas durante suas explorações dos novos domínios, que ele tentara ocupar para a Espanha.



Em 1534, os espanhóis, ainda otimistas, enviaram uma primeira missão de colonizadores, sob a liderança de Pedro de Mendoza. Naquele mesmo ano, fundaram uma cidade na atual localização de Buenos Aires. Deveria ser um lugar ideal para os europeus. Buenos Aires, que literalmente significa “bons ares”, tinha um clima temperado e convidativo. A primeira temporada dos espanhóis por lá teve vida curta, porém. Afinal, eles não estavam atrás de bons ares, mas de recursos para extrair e mão de obra para coagir. Os charruas e os querandís, contudo, não se mostraram nem um pouco cooperativos. Recusavam-se a fornecer alimentos para os espanhóis, assim como se recusavam a trabalhar quando capturados. Atacaram o novo povoamento com arcos e flechas. A fome grassava entre os espanhóis, que não haviam planejado ter de obter a própria comida. Buenos Aires não era, absolutamente, o que haviam sonhado. Os povos locais não se deixavam forçar ao trabalho. Não havia ouro nem prata a explorar, pois a prata encontrada por Solís na verdade viera do estado inca nos Andes, bem mais a oeste.



Os espanhóis, enquanto lutavam pela sobrevivência, puseram-se a enviar expedições para encontrar um novo lugar, capaz de proporcionar-lhes maiores riquezas e uma população mais fácil de subjugar. Em 1537, uma dessas expedições, sob a liderança de Juan de Ayolas, penetrou no Rio Paraná, em busca de uma rota que os levasse até os incas. No caminho, entrou em contato com os guaranis, povo sedentário de economia agrícola, baseada no cultivo de milho e mandioca. Ayolas percebeu de imediato que se tratava de um povo completamente distinto dos charruas e dos querandís. Após um breve conflito, os espanhóis venceram a resistência guarani e fundaram uma cidade, Nuestra Señora de Santa María de la Asunción, até hoje a capital do Paraguai. Os conquistadores desposaram as princesas guaranis, estabelecendo-se assim como a nova aristocracia. Adaptaram os sistemas indígenas existentes de trabalho forçado e tributação, colocando-se no comando. Era esse o tipo de colônia que desejavam e, em quatro anos, Buenos Aires estava abandonada, pois todos os espanhóis que lá haviam se estabelecido mudaram-se para a nova cidade.



Buenos Aires, a “Paris da América do Sul”, cidade de largas avenidas no estilo europeu, baseada na incalculável riqueza agrícola dos pampas, não seria repovoada antes de 1580. O abandono da cidade e a conquista dos guaranis revelam a lógica da colonização das Américas pelos europeus. Os primeiros colonos espanhóis e, como veremos, ingleses não tinham o menor interesse em lavrar o solo com as próprias mãos; queriam que outros o fizessem em seu lugar e desejavam riquezas – ouro e prata – para saquear.

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