Industrialização do Sono




Daniela Lima: Tem uma coisa que me chamou bastante atenção no livro, e o senhor trata desse assunto em vários lugares, mas enfim, o pesado investimento da indústria farmacêutica no sono, algumas das drogas mais vendidas do mundo são drogas para fazer dormir, ao mesmo tempo o senhor diz que não há nenhum investimento na questão do sonho. Fale um pouquinho pra gente sobre isso, inclusive é uma coisa interessante que você diz: a mercantilização da palavra sonho né, sonho quando aplicado no nosso dia-a-dia está muito vinculado ao desejo de adquirir alguma coisa, enfim, porque, qual é,  porque que desbalanceou? Porque que gasta -se tanto pra poder dormir e não se fala dos benefícios ou de que tipo de proveito você pode tirar de um bom sono com um bom sonho? 


Dr. Sidarta Ribeiro: Daniela eu acho que é até pior, porque esses remédios em sua maioria não induzem sono, induzem um simulacro de sono. O sono não é um apagar do cérebro, o sono não é um desativar do cérebro, essa é uma concepção de cem anos atrás. O sono na verdade é extremamente ativo, durante o sono a gente tá produzindo um monte de moléculas, se livrando de um monte de toxinas, esquecendo memórias, consolidando memórias, misturando memórias pra poder gerar a criatividade, soterrado algumas memórias com as quais a gente não consegue lidar, que é o processo da repressão, então tudo isso tá acontecendo quando a pessoa toma um barbitúrico, toma um gabaérgico, um benzodiazepínico, ela não entra em sono, não é um sono saudável, um sono bacana, um sono restaurador, é uma espécie de apagão, e no dia seguinte ela acorda muitas vezes cansada, irritada, e com problemas de memória, então o problema é que as pessoas estão abandonando o que é natural que é a nossa capacidade de dormir e sonhar, qualquer pessoa tem a capacidade de dormir e sonhar, assim como tem de respirar ou de se alimentar, faz parte do "hardware" biológico e nós estamos trocando isso por uma medicalização, tem a pílula pra dormir e tem a pílula pra acordar, tem a pílula pra poder trabalhar, tem a pílula pra concentrar, tem a pílula pra namorar, é surreal, qual é o caminho? 

     O caminho é voltar pra sabedoria dos antigos, é sono, é exercício físico, é alimentação, relações bacanas, cultura, livros, né! Porque as pessoas não tem sono quando estão de frente a uma tela? Porque aquela luz que chega inibe a formação da melatonina, que aliás é única dessas todas que eu separo como sendo uma coisa bacana, eu defendo... sou muito crítico dessas substâncias no meu livro, mas defendo o uso de melatonina que é produzida pelo próprio cérebro e as vezes a pessoa não tá produzindo é preciso ingerir, mas é melhor ainda que ela produza, e pra ela produzir é muito simples, apaga todos os aparelhos elétricos e pega um livro bom e depois de algumas páginas ela vai dormir. 

     Esse é um trecho da entrevista do neurocientista Sidarta Ribeiro no programa Roda Viva da TV Cultura, da fundação
Padre Anchieta, professor na Universidade Federal do Rio Grande do Norte, um dos cientistas mais renomados do país. Autor do livro "O Oráculo da Noite" que destaca o papel do sonho para a evolução da humanidade. Nessa obra o cientista chama atenção para que as pessoas prestem atenção às mensagens do inconsciente.  É um tema sobre o qual por diversas vezes eu reflito, pois a qualidade de vida é na minha opinião uma preocupação com a qual todos deveríamos pensar, de uma maneira profunda. Uma vez vi escrito no banheiro da faculdade de história da UFG em Goiânia, onde estudei pelos ano de 2015/2016, a frase da música de Elis Regina: Viver é melhor que sonhar. Mas logo abaixo se seguia uma discussão como que prevendo os longos debates no mural do Facebook, só que era o mural do banheiro de uma universidade pública, o autor da escrita da frase foi interpelado por ouro pichador que completou a assertiva: Depende de como se vive! E olha, apesar do lugar e do modo, é uma baita discussão relevante. Já publiquei nesse mesmo blog sobre a necessidade de sonhar, mas esse professor debate em seu livro uma discussão mais profunda sobre o significado de sonhar, ou, o que se entende por sonhar. 

       Existe em nossa geração uma dependência cada vez maior das coisas sintéticas, coisas transformadas em laboratórios, processos químicos, como o próprio professor fala, pílula pra namorar, pílula pra dormir e isso abrange todas as faixas etárias atualmente, até mesmo crianças são postas como reféns da indústria farmacêutica, claro não me coloco aqui como um inimigo de um ramo tão importante para a sociedade que é o ramo farmacêutico, porém nessa era onde tudo é máquina ou comprimido, industrializado, temos que levantar a bandeira em defesa das coisas naturais que exigem apenas que não sejamos tão avassaladores sobre a natureza, sobre os animais, sobre o meio ambiente dos quais dependemos quase que totalmente. Atualmente nem os fins têm justificado os meios, para uma devastação num nível tão alto da natureza que o mundo tem experimentado atualmente. O mundo é a nossa casa, e o ímpeto capitalista parece segar muitos que se não houver rio, não houver floresta não há cidade, não há shopping, não há loja, não há internet que substitua. 

  Não tem como não citar o debate ambiental que é imperativo que coloquemos em pauta nas nossas rodas de conversa com os amigos e familiares, que é onde a verdadeira audiência transforma. Precisamos reavaliar se nosso medo de subsistência tem de fato nos feito bem, se nossa forma de trabalhar, de se relacionar, com os outros e conosco mesmo têm valido a pena. É a hora de pensar antes de agir, se colocar em reflexão urgente se é essa vida e esse futuro que realmente queremos para nós como nação, como família, como seres humanos. 

  Sobre o sonho, é uma maravilhosa ferramenta dada a nós como o combo de uma natureza pródiga de riquezas, como substâncias naturais que automaticamente produzimos e restaura em nós exatamente tudo o que precisamos. Já parou pra pensar que muitas vezes não fazer nada pode ser a melhor ideia? Em relação a apenas experimentar o que a natureza dá. Sabedoria dos antigos, dos índios e nativos que muitas vezes foram chamados de selvagens, mas hoje se faz muita falta a sabedoria dessa gente que já sabia há muito tempo que somos parte de uma conjunto muito maior. 

O que você pensa sobre isso? compartilha aqui nos comentários o que você pensa sobre isso tudo, tens alguma crítica, complemento, sugestão?

Obrigado pela leitura.




Comentários

  1. Fantástico! O sonho é essencial para recuperação da nossa mente e consolidação da memória, fiquei com vontade de ler o livro.

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    Respostas
    1. Olá, se inscreva no blog pra acompanhar minhas postagens. Eu também fiquei morrendo de vontade de ler esse livro ao assistir a entrevista. Esse neurocientista é muito bem reconhecido, sorte nossa ter gente assim no Brasil e deveríamos valorizar cada vez mais.

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